quinta-feira, 28 de março de 2013

Esquina

A rua é calada,
mas um dia ela fala,
E dirá:
Quero um novo caminho.
Porque até ela,
tão certa do destino
cansou desse rumo,
quer ser esquina,
cruzar a avenida
e chegar naquele mar
a quem, de longe, era ela a passarela
Quanto ao mar,
digo o seguinte:
A.
Ah, mar, por que?
Por que tão distante?
Por que tão minotauresco?
É porque, assim, brusco
mostra um monstro
quando a gente pensa
que se achou.
Ah, mar,
não reticentize a angústia
Exclame...
Ela não Iariza o alvo,
mas é a Ariadna dessa profundeza louca
dessa profunda loucura
que é o mar.
Ah, mar..!

segunda-feira, 25 de março de 2013

O vento

Ao passo em que o passado passa
É certo que eu prefira outros caminhos
Porque de passo em passo se constrói o rastro.
A gente quer é mudar o sentido do mastro
E deixar que o vento sopre atento
Ao contrário desses olhos
Que, pequenos, perto dessa imensidão
Seguram a mão de alguém
E simplesmente vão.
A direção, quem sabe, seja essa:
O não.

domingo, 17 de março de 2013

Engano

De todo o amor que investia, metade ele convertia em orgulho. Talvez amor não seja a palavra - e o sentimento - mais adequado para a situação. De dentro do seu peito pulsava um querer infame, um desejo gritante. Situada a ação, pode-se dizer que o que ele vivia era uma paixão tórrida e real que lançava ao objeto uma correnteza de libido inebriante. Só que, como era de se esperar de uma paixão tão efusiva, pra não dizer invasiva, o moço desrealizou a vida e perdeu o chão. Andava, portanto, em calços de orgulho que construía através de atitudes que só tinham sentido no seu mundo estranho. Coitado. Afogado em tanto querer, não se agradava de tamanha paixão orgulhosa que saltava de seus olhos, de seus poros, mas como um vírus, ele sentia e, contra sua vontade, crescia como um balão que enche com o fogo, no caso, de paixão. Mas ele não se entregava! Doava-se apenas em metade. A outra ele penhorava em seu orgulho, pra não dizer medo de não-amor.
Não durou mais que duas desilusões esse orgulho apaixonado. Desapaixonou, desiludiu, mas orgulhoso, cuspiu nos olhos calejados de tanta dor que, um dia, viram-no como um futuro bom. Dizendo que fora um engano, como quem liga errado para o número certo e troca de voz pra justificar a falha, o moço deu adeus à projeção que construíra de um outro perfeito, o qual inevitavelmente apenas levava calado o fardo de ser humano.

quarta-feira, 13 de março de 2013

Dança

Essa dor aguda
que aperta o seio
é manifestação fajuta
desse amor que,
feito fruta,
amadurece no peito.

Não acredito
no samba que canta
só verdade.
Quero o bendito choro
da moça bonita
que dança tranquila
a insanidade.

Porque é aí
nesse amor fajuto
que mora o perigo:
é fogo de brasa mansa
mas queima astuto
onde tem que queimar
e carrega consigo
todo sentido.
Senti dor,
mas um dia a gente cansa.
E dança.

domingo, 10 de março de 2013

Estou rouco.

Não sei se o pouco de louco que tenho é o suficiente para me deixar rouco desse grito dormente que sai do hiato entre a mente e o eu ausente. Às vezes a voz é o bastante, em outras eu quero mais, eu quero gente. Porque enquanto gente eu me sinto só, no vácuo profundo, num nó. Talvez não baste ser gente, é preciso ser forte, mas e quando se é carente? Simplesmente se aceita o fardo, calado. Um pouco cansado, eu diria, um dia se consegue ultrapassar essa vírgula danada que separa, mesmo que ingrata, o verbo do sujeito doente. E já na retidão que concorda na semântica, quem sabe se diminua a rouquidão num grito que acorda pra vida os olhos nus e afoitos por um clarão de certezas.

Fluido e desejoso

Se te ajuda,
Se te consola,
eu cansei.
Essa coisa de sofrer
Não cabe mais nos meus dias
Aliás, nos de ninguém.
Essa esmola recebida
Não paga o olhar
o pecado
a falha
a falta.
Um recado: seja.
Porque de morrer em morrer
A gente flui e deseja.
Esquece aquilo que cala
E dança passos fortes
em pisos fracos,
Que sustentam apenas o querer.

terça-feira, 5 de março de 2013

Malabarizar

No fim, vive-se num ciclo que varia entre a beleza e a destreza de uma vida irregularmente na medida, num mundo compatível a ela e num destino que se camufla de futuro. E por gostar de gente, acabo por extensão gostando de mim também.