No divã:
_ Doutor, estou com
problemas...
_ Fale sobre eles.
Que tipo de problemas?
_ Eu sempre pensei
que poderia ser alguém sozinho. Mas você sabe, não dá. Eu tenho
uma mania de sempre querer mais, ela sempre me atrapalha, mas eu
sinto que preciso dela porque nós somos capazes juntos. Não sei se
a vossa senhoria, magnífico e cheio de inteligência está
entendendo o que eu quero dizer, mas eles precisam de mim e eu
deles.
_ Já pensou em
conjugar seus problemas?
_ Sim! Três vezes,
estou indo pra quarta meio irregular.
_ Três?
_ Sim. A primeira
era muito passional só queria saber de amar, casar, não me fez
muito a cabeça, a não ser quando ela queria transar, mas eram
poucas as vezes. A segunda era de beber, não acho certo. Só queria
comer... A terceira era muito boa em partir meu coração, aí
simplesmente a deixei ir. Agora a quarta põe a felicidade nos meus
dias, mas não se encaixa no meu padrão de viver.
_ Qual padrão?
_ Ah, não é
necessariamente um padrão. Tem dias que acordo meio irregular. Tudo
é muito relativo.
_ Interessante...
_ Interessante? É
triste! Eu não sei onde me colocar. Quando negam alguma coisa pra
mim, sempre me coloco à frente, não sei me segurar. E se me mandam
fazer algo, eu procuro uma outra ação, preciso de tratamento, por
isso o procurei, talvez o senhor me torne mais ponderado, menos
imperativo.
_ Eu entendo. Fale
mais sobre isso.
_ Sobre o quê?
_ Sobre você!
_ Mas o problema não
sou eu, doutor, eu estou bem, o problema maior está nos outros.
_ Não é o jeito
que você lida com os outros?
_ Talvez sim e
talvez não. Entende? Eu até concordo que tudo tem uma parcela da
minha interpretação, legal. O problema, doutor, é que os outros
fazem de um tudo para me irritar, como que o problema pode estar em
mim?
_ Já pensou na sua
colocação dentro da situação?
_ Quê? Olha,
doutor, não estou gostando do rumo da conversa.
_ Eu digo se você
vem à frente, fica no meio termo ou na retaguarda quando o sujeito
de tudo é você mesmo.
_ Penso que não vim
fazer terapia sexual, desculpa.
_ E quem falou de
sexo?
_ Ah, não se
faça... Todo mundo sabe que o Freud era um maníaco sexual, até
mesmo minha mãe.
_ Interessante você
falar da sua mãe...
_ Não, nunca me
apaixonei pela minha mãe.
_ Tudo bem,
desculpa, já vi que você não é um sujeito simples, é daqueles
que se deixa oculto.
_ Não me venha com
metáforas, comparações ou paradoxos, eu quero paz e você está
me deixando nervoso.
_ Não sabia que
terapia é mexer com o que já decantou?
_ Estava tudo muito
bom enquanto falávamos português.
O sujeito conjugou o
verbo sair no pretérito perfeito do indicativo, na terceira pessoa do singular e nunca mais voltou.
Um comentário:
Haha, que delícia de texto. O analisando mais fofo do mundo, esse teu. Quero pra mim um analisando desses, hihi. Nossa, sério...Que texto levíssimo, uma pluma de ser ler.
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